quinta-feira, 29 de setembro de 2011

ÌJUBÁ!

Contra a discriminação religiosa e o preconceito aos adeptos do candomblé!

O curta tem duração de 20'55", aqui apresentados em 2 partes, e foi produzido pelo acadêmico de Jornalismo da UFAL, Kleverton Almirante.

Baseado no candomblé, o vídeo registra depoimentos colhidos entre adeptos, simpatizantes e cidadãos comuns, sobre a religião. As falas ajudam a desmitificar sua demonização, enaltecendo a beleza e a riqueza das forças da Natureza representadas nos orixás.
Parte I


Parte II



Ìdajó ati Ìjubá! - Justiça e Respeito!
Òlorún xé á ìdajó! - O Senhor é quem faz justiça por nós!


Axé a todos os nossos irmãos!
Deus é tudo acima de todas as coisas!
Olorum Colofé!

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Os sacrifícios no candomblé

"No dia em que um homem engolir uma galinha inteira, viva, sem tirar as penas, o sangue, as vísceras; no dia em que um parto não sangrar e a água não verter sobre a Terra, neste dia eu deixo de cortar para o orixá."
Pai Cido



Sacrifício não é sinônimo de assassinato, relacionado que está a rituais sagrados, visando, no candomblé, ampliar, acumular e distribuir a força vital e sagrada que é o axé. Boa parte das religiões utilizava sacrifícios em seus rituais, mas na maioria das vezes o sentido era expiatório, não se aplicando essa noção ao candomblé por um motivo aparentemente simples: no Candomblé não existe pecado, portanto não há o que expiar.

Entre os cristãos, por exemplo, a extinção do sacrifício (em termos gerais) justifica-se pela morte de Jesus Cristo, que teria morrido para salvar a humanidade no mais importante sacrifício que o mundo assistiu. Ocorre que Jesus morreu pelos cristãos, e não pelo Candomblé, e isso significa, na realidade, que os ritos processados em outra doutrina religiosa não fazem nenhum sentido para os orixás; da mesma forma que os rituais do Candomblé fogem à compreensão da Igreja católica. Em outras, palavras, o Candomblé só se explica pelo Candomblé, não adiantando recorrer à bíblia para explicar e muito menos condenar as práticas da religião dos orixás.

O sangue é de importância vital para os orixás, pois está ligado á concepção, à fertilidade, ao nascimento e a todas as etapas da vida. Sem haver sangue não há axé, ninguém nasce sem sangue. Quando deixar de haver sacrifícios, o Candomblé deixará de existir.

Não se derrama o sangue dos animais por maldade, por crueldade, muito menos para fazer mal a alguém. O sacrifício é a condição para que a vida continue, e não apenas no Candomblé. Todos se alimentam, seja de carne, seja de vegetal, e um boi só pode ser comido em bifes, ou seja, em partes e depois de morto; uma alface, ao ser desconectada de sua raiz, também é morta. Porque não se pode atribuir um significado religioso a um ato essencial para a sobrevivência humana? Será mesmo que a condenação do Candomblé se deve ao sacrifício? Não seria essa uma forma de a sociedade camuflar preconceitos mais profundos?

O ritual macabro não está nos Candomblés e sim nos matadouros, onde os animais são submetidos a inúmeras crueldades e morrem com muito sofrimento. Imaginem um animal ainda vivo tendo a sua pele arrancada: isso é um exemplo do que ocorre nos matadouros. É por isso que a carne que será consumida pelos iniciados deve ser sacralizada por meio de rituais específicos; a carne de um animal que morreu com sofrimento não faz bem a ninguém. Os judeus e mulçumanos, por exemplo, só consomem carnes de animais abatidos de acordo com seus preceitos. Por que o Candomblé não pode fazer o mesmo?

É um absurdo acusar o Candomblé de fazer sacrifícios humanos, como têm feito certas igrejas. O Candomblé não é uma religião hipócrita e assume o que faz. São sacrificados, sim, bois, bodes, galinhas, patos e muitos outros animais, que depois servem de alimento à comunidade, mas nunca seres humanos, pois o orixá vive no homem e através do homem.

Todo homem sacrifica, não necessariamente num sentido religioso, e mata para sobreviver. Qual mal pode haver em oferecer aos deuses as partes que os homens não consomem?

Lembrem-se de que Jesus foi condenado à morte por pessoas que viriam a santificá-lo depois, fazendo sinal-da-cruz, adorando a sua imagem ensangüentada. Pois que fique bem claro: não somos contra o homem Jesus, mas contra os homens que mataram Jesus. Nós não matamos nossos orixás, nós os amamos com todos os seus defeitos e qualidades.

Para o Candomblé, tudo que a natureza produz é sangue, pois o que define o sangue é a força que detém, ou seja, o axé, e um sacrifício requer a utilização de vários tipos de sangue, vindos das mais variadas fontes da natureza, atribuindo vida e sentido ao orixá, aos homens e à própria existência.

[Notas Bibliográficas e Comentários]

Transcrito do Livro “Candomblé – A panela do segredo”, de Pai Cido de Òsun Eyin com a colaboração de Rodnei William Eugênio, publicado pela Editora ARX, pp. 275 a 277.

Axé a todos os nossos irmãos!
Deus é tudo acima de todas as coisas!
Olorum Colofé!

Legba carrega uma panela que se transforma em sua cabeça


Ifá andava triste e desolado,
tendo se desentendido com seu rei.
Ele consultou o oráculo para saber o que fazer.
Foi dito que fizesse uma oferenda
com tudo quanto era fruto redondo.
Mas o ebó deveria ser entregue por sua mãe.
Como a mãe de Ifá morava longe,
Ifá pagou a Legba um galo e uns doces para ele ir buscá-la.
Exu chegou à casa da mãe de Ifá
e disse que a levaria à casa de seu filho
desde que ela lhe pagasse alguma coisa.
Mas ela não tinha nada para oferecer a ele.
Exu disse que queria o bode de doze chifres
que tinha visto no quintal da casa dela.
Ela disse que o bode não era dela,
ela apenas o guardava.
Legba insistiu.
Legba tomou o bode e o matou.
O sangue do bode jorrou e era puro fogo
e o fogo tomou conta de Exu.
Ele consultou o babalaô
e foi dito que fizesse uma oferenda
com os órgãos internos do bode.
Ele o fez e em seguida se pôs a cozinhar a cabeça.
Mas a cabeça do bode não cozinhava,
por mais que a panela ficasse no fogo.
Ele tomou a mãe de Ifá e a panela
e resolveu voltar à cidade de Ifá, levando a mulher.
Usando um pano torcido,
Legba fez uma rodilha para carregar a panela nos ombros
e a panela grudou nele e se transformou em sua cabeça.
Naquele tempo Exu ainda não tinha cabeça.
Eles chegaram à casa de Ifá e a mãe narrou ao filho o ocorrido.
Ifá lamentou-se por também não ter cabeça.
Foi dito que se fizessem sacrifícios com frutas redondas
para ganhar um ori.
A mãe levou ao rei a cabaça contendo as frutas redondas.
O rei tomou um mamão e o partiu em dois.
Uma metade do mamão fixou-se entre os ombros
e transformou-se na cabeça do rei.
Assim foram nascendo as cabeças.
Exu foi o primeiro a ter o ori fixado nos ombros.
Precisa fazer sacrifício
quem quiser ter uma cabeça.

[Notas Bibliográficas e Comentários]

Transcrito do livro Mitologia dos Orixás de Reginaldo Prandi publicado pela Cia das Letras, págs 49 - 51. Originalmente encontrado em Bernard Maupoil, 1943, pp. 53-5; Juana Elbein dos Santos, 1976, pp. 214-5. Para os iorubás, a cabeça, o ori, é uma dádiva que recebe sacrifício, tradição mantida nos candomblés através do bori, cerimônia de dar comida à cabeça.

Ebó [ebò]: sacrifício, oferenda, despacho.
Ori [orí]: cabeça; destino.

Axé a todos os nossos irmãos!
Deus é tudo acima de todas as coisas!
Olorum Colofé!